Capítulo 9
Ando pelo quintal, ele é bem grande e eu ainda não vi tudo que tem por aqui. A verdade é que estou com tédio e resolvi sair de casa pra variar.
Em um dos cantos vejo toras de madeira empilhadas e pelo pouco que dá para enxergar além delas, há um caminho que estão bloqueando.
Com muita dificuldade tiro uma por uma, até finalmente liberar espaço para que eu possa passar.
É um pequeno bosque lotado de árvores altas. As folhagens cobrem boa parte do sol que tenta entrar ali. Eu realmente não me lembro de ter vindo nesse lugar quando era mais novo.
Caminho meio sem rumo, mas em linha reta, não sei oque espero encontrar por aqui. Paro quando começo a ouvir um som suave.
Continuo andando em direção ao som, que agora está mais alto. É uma melodia calma e muito boa de se ouvir.
Finalmente descubro sua origem, assim que afasto alguns arbustos e entro em uma clareira. Sentado em um tronco, próximo a uma fogueira apagada, há uma mulher.
Seus cabelos loiros balançam suavemente com o vento e seus dedos dançam sobre a flauta que está tocando.
Não consigo ver quem é, então me aproximo um pouco mais. Pode parecer estranho ficar ali parado, mas quero ouvi-la até o fim.
Ela termina de tocar e solta um suspiro.
- É falta de educação ficar ai observando as pessoas. - Seu tom de voz parece esconder uma certa irritação.
Ela está certa.
- An, me desculpe, é que a música estava tão boa e eu não queria atrapalhar. - Tento me explicar.
Ela se vira.
- É só isso? - Pergunta me encarando com seus olhos azuis.
Finalmente descubro quem é. A mesma mulher que levou Sophie para dentro de casa naquele dia.
Apenas balanço a cabeça para responder sua pergunta. O que mais poderia dizer?
- Certo, então já pode ir. - Diz se virando novamente.
- Espera, deixa eu ao menos me apresentar. - Digo me aproximando.
Não sei ao certo porque estou me esforçando tanto. Acho que quero poder conhecer o máximo de pessoas possíveis aqui. Sim, é isso.
Ela resmunga algo e volta a olhar para mim.
- Eu me chamo...
- David, a Sophie me contou. - Me interrompe.
- Isso. É você é a... a...
Agora que paro pra pensar, eu não cheguei a descobrir seu nome naquele dia.
- Hanna. Como encontrou esse lugar? - Pergunta me ignorando.
- Bom, minha fazenda fica próxima a entrada desse bosque, então não foi difícil.
Ela suspira novamente.
- É uma pena, eu gostava daqui. - Diz desanimada.
O que ela quer dizer com isso?
- Como assim? Você pode vir aqui quando quiser. - Digo rapidamente e ela me olha como se a resposta fosse óbvia.
Não é como se eu pudesse impedi-la.
- Mas agora você sabe como chegar aqui. - Sua expressão ainda é de preocupação.
- Prometo não incomodá-la. - Digo me virando.
- É um grande favor que está me fazendo. - Grita antes de voltar a tocar.
Que mulher estranha.
Volto para cara e continuo andando pelo quintal na intenção de esquecer toda essa conversa. Quando dou por mim, já anoiteceu.
Mal consigo ver o resultado dos meus esforços, eu definitivamente preciso colocar alguma iluminação aqui. Só a luz fraca da varanda não é o suficiente.
Quando me viro para entrar em casa ouço um latido. Desço o olhar e vejo um filhote parado me observando.
- Ei rapaz, o que faz aqui? - Pergunto enquanto afago sua cabeça.
Ele late mais uma vez e logo em seguida ouço passos vindo em minha direção.
- David, que bom que você conseguiu pará-lo. - Diz Sophie se aproximando.
- Então ele é seu, estava fugindo é? - Pergunto mais uma vez ao cachorro.
Ele late novamente. Talvez eu tenha algum dom com os animais.
- Ele não costuma fugir desse jeito. Não sei oque aconteceu. - Diz preocupada.
- Está tudo bem agora. - Acalmo-a enquanto o pego no colo.
- Ele parece ter gostado de você. - Sorri.
Lembro-me da época em que ajudava meu avô aqui na fazenda.
- Então, quer que eu te acompanhe até em casa? - Pergunto.
- An, eu não quero que se dê ao trabalho e...
Estendo minha mão para que ela pare de falar.
- Não se preocupe, vamos?
Caminhamos em silêncio por alguns minutos.
- O que você faz para passar o tempo aqui? - Pergunto enquanto olho para frente.
Sophie parece pensar.
- Eu gosto de andar por aí, observar os peixes na ponte. As vezes eu converso com minha amiga durante horas.
É muito melhor do que eu venho fazendo ultimamente.
- Já você trabalha demais, não é? - Pergunta.
Demoro demais para responder, oque a faz ficar envergonhada.
- Me desculpe pela indelicadeza. - Ela se atrapalha nas palavras.
- Não, não é isso. Só estou pensando nessa sua afirmação. De certa forma você está certa.
Claro, não dá pra comparar oque tenho feito aqui na fazenda com oque fiz durante minha vida empresarial.
- Você tem se esforçado muito desde que chegou aqui, apenas não exagere. - Sophie me olha e apesar da escuridão, consigo ver seus olhos brilharem.
Conheço-a há pouco tempo, mas nunca havia visto esse lado preocupado dela.
- Está tudo bem. - Digo sorrindo.
Chegamos a casa de Sophie. Consigo ver as margaridas em seu pequeno jardim, mas é a primeira vez que presto atenção na aparência da casa.
É um casarão azul com uma porta marrom escuro. As janelas são retangulares e estão cobertas por cortinas brancas.
- Obrigada por me acompanhar até aqui, foi muito bom conversar com você. - Diz corada.
- Eu que te agradeço, por tudo na verdade.
Ela balança a cabeça.
- Mas eu não fiz nada demais.
- Sophie, olha só, eu...
Ouço alguém pigarrear.
Olho para o lado e vejo o prefeito parado na porta. Ele apenas arqueia a sobrancelha e Sophie concorda com a cabeça.
- Desculpe-me David, preciso ir. - Se despede e sai.
- Espero que minha neta não esteja lhe incomodando, senhor Jones. - Diz o prefeito assim que Sophie entra.
- De modo algum, eu gosto da companhia dela.
- Certo. Já está ficando tarde, recomendo ir para casa. - Adverte antes de entrar e fechar a porta.
Fico por alguns segundos encarando a casa. Está silencioso, mas não consigo parar de achar estranho esse comportamento do prefeito.
Por fim desisto e vou em direção ao bar, parece estar funcionando hoje.
Assim que entro, Penélope olha em minha direção e sorri.
- Que bom te ver. - Diz assim que me aproximo.
- Está bem movimentado hoje. - Olho em volta.
Há pessoas dançado na pista e os músicos tocam avidamente.
- O pessoal gosta de uma boa agitação a noite.
Aponto para o barril de cerveja e Penélope concorda com a cabeça.
- Você por outro lado parece que viu um fantasma. - Coloca o copo com a bebida em cima do balcão.
- Eu conversei com o prefeito hoje. Ele parecia meio...
Seria rude da minha parte dizer assustador?
- Estranho...
Penélope suspira.
- Olha, sugiro que tome cuidado ao se envolver com o prefeito e principalmente com sua neta.
Já é a segunda pessoa aqui que me avisa sobre isso.
- Por que diz isso? - Pergunto.
Penélope fica alguns segundos em silêncio.
- Não é nada, deixa pra lá.
Depois de tudo isso, não é algo que eu consiga ignorar facilmente. Ainda assim, sei que não vou conseguir arrancar alguma informação dela.